Lula descarta medidas para desvalorizar real
KENNEDY ALENCAR
colunista da Folha Online
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva dedicou enorme tempo de suas últimas conversas reservadas a discutir o efeito sobre a economia da nova onda de valorização do real na comparação com o dólar. Na sexta 29 de junho, o dólar terminou o dia cotado a R$ 1,97 --primeira vez em oito meses abaixo dos R$ 2.
Conclusão principal das conversas de Lula: não há muito o que fazer. Ou seja, descartou, por ora, medidas cambiais específicas. Exemplo: voltar a cobrar IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) de investimentos externos.
Para o presidente, uma medida como a cobrança do IOF teria um custo-benefício baixo numa hora em que o Brasil é visto como porto seguro na crise. O discurso de que o Brasil entrou depois e está saindo antes da crise internacional poderia ser arranhado, acredita o presidente. Na visão do petista, melhor surfar na boa propaganda de que o país é um bom lugar para receber recursos externos, por mais que hajam efeitos colaterais sobre as exportações.
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Drible monetário
O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, que tem se notabilizado pela habilidade em fugir das pressões de Lula e do ministro Guido Mantega (Fazenda), jogou no ar a possibilidade de cobrança de IOF. Sabia que, por ora, seria improvável a adoção, mas tirou pressão de duas outras alternativas para intervir no câmbio: acelerar a queda dos juros e voltar a comprar reservas cambias em dólares.
O BC vai continuar a reduzir os juros, mas quer fazê-lo dando um desconto às pressões de Lula e Mantega nesse sentido. O atual patamar de reservas cambiais, cerca de US$ 200 bilhões, é considerado satisfatório pelo BC. Deu resultado na crise, amortecendo o impacto da crise externa.
Os chumbos trocados na equipe econômica acabam anulando uns aos outros.
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Próximo lance
O Copom (Comitê de Política Monetária) terá reunião na próxima semana, dias 9 e 10 de junho. O Copom é o órgão formado pelos diretores do BC que se reúne a cada 45 dias para fixar os juros básicos, a Selic, hoje em 10,25% ao ano. Será a quarta reunião do ano do Copom. Faltarão outras quatro.
Na avaliação de integrantes da cúpula do governo, Lula fará pressão por uma taxa que chegue ao final do ano na casa dos 8%. Esses próprios integrantes acham que o BC que ficar na faixa dos 9% anuais.
Trocando em miúdos: uma decisão de redução superior a 0,5 ponto percentual contemplaria o desejo de Lula. De 0,5 ponto para baixo, seria o BC conservador e velho de guerra. Caso seja exatamente meio ponto percentual, poderíamos falar em empate com viés pró-BC.
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Socorro a exportadores
No cenário de deixa como está para ver como fica, o governo estuda medidas setoriais para os exportadores. Seria uma combinação de mais crédito com alguma redução de impostos. O problema é que o espaço para essas medidas é pequeno num momento de queda na arrecadação de tributos.
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Discurso fácil
Nada como dar bater nos políticos. A população gosta, e motivos não têm faltado. Mas nem tudo são espinhos. O debate sobre a reforma política, por exemplo, tem sido bom. Fazia tempo que não se via uma discussão sobre o voto em lista e o financiamento público descer aos detalhes.
O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), está certo em forçar uma decisão do Congresso, ainda que ela seja não modificar nenhuma das atuais regras político-eleitorais. O Legislativo não trabalha só quando vota.
Kennedy Alencar, 41, colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre bastidores do poder, aos domingos. É comentarista do telejornal "RedeTVNews", de segunda a sábado às 21h10, e apresentador do programa de entrevistas "É Notícia", aos domingos à meia-noite.
E-mail: kennedy.alencar@grupofolha.com.br